quarta-feira, 5 de setembro de 2007

O que é um disparador?

por Sandra Knoll, atriz

Na oficina Procedimentos para Atuação no Espaço Urbano ministrada por Narciso Telles e que lidava com princípios dos viewpoints de Anne Bogart, houve para mim descobertas que ainda estou processando... Ao lidar com o espaço externo (nesse caso, lugares concretos, salas, móveis, igrejas, praças, etc...) como motivador/disparador do meu espaço interno (meu corpo/memória), me vi entrando em cena com a tarefa de interpretar nada pré-estabelecido. "Escutar" o que o espaço, as formas, os cheiros, as texturas me propunham como disparadores de ações cotidianas se tornava um desafio constante... ter a percepção de quando eu estou representando demais.

Nessa oficina, a proposta se direcionava, grosso modo, ao jogo coletivo, à uma atuação que deve apossar-se dos espaços para criar imagens, propondo jogos que permitam ler uma cena com outra métrica: ao invés de uma cena onde um personagem vive determinado conflito dramático, o personagem se configurava quase que coletivamente, a partir dos muitos corpos que geravam imagens espaciais junto aos nossos cenários urbanos.

O trabalho, portanto, foi desenvolvido em espaços não-convencionais. Um antigo colégio foi o local inicial da oficina, e sua estrutura em si propunha elementos bastante provocativos. Salas de colégio, banheiros, pátios, carteiras e cadeiras empilhadas do lado de fora. No segundo dia, a praça da igreja matriz, chafariz, gramas, escadas, parques, crianças correndo e brincando no parquinho, pipoqueiro... "estar" e "ser" num lugar tão cheio de interferências. Como “atuar” num lugar no qual tantas coisas te tiram e prendem a atenção. O que fazer com tantos “disparadores”?

Ter que escolher, optar o que eu quero e o que não quero nesse universo amplo de motivações foi essencial pra conseguir chegar a algo talvez pequeno, porém, representativo no momento. Nesse sentido, o exercício de um registro menos interpretativo e teatral foi um dos focos importantes da oficina. Porém, no momento em que estávamos lá, fazendo, muitas vezes não sabíamos bem o que se configurava num olhar externo. Traduzindo isso para hoje no trabalho que estamos desenvolvendo no Espaço em Aberto ainda é muito vago e confuso... Chegar a entender como esse registro acontece dentro das estruturas que estamos criando é ainda uma incógnita. Mas a experimentação não pára por aí.

Esse projeto criado pela companhia provoca a definição da pesquisa em que estamos, cada um de nós, engajados. A continuidade dos procedimentos que realizamos nas oficinas anteriores constitui uma base pra descobrirmos barreiras em nós, em nosso corpo, em nosso espaço interno/externo. Trazer a tona memórias do corpo de uma linha de vida como depoimentos corporais foram se casando com os temas que cada um tinha no início do processo em que ainda não sabíamos o que era realmente (será que já sabemos?).

Talvez esse processo seja realmente bem amplo e aberto. Entretanto o que mais percebo é a abertura que ele propicia às discussões entre o grupo. Discutir os lugares que cada um está no momento e, como este lugar se dá pra cada um. Há uma preocupação maior em saber quem somos como artistas e como grupo. Como cada um pode dar segmento ao seu trabalho de investigação individual ou grupal. Além de um espaço aberto como local de cena, há um outro que é o local do sujeito no coletivo...

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