sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Alguns diálogos



Maria – Passe por favor, pode entrar. A gente vai esperar bastante.


Edith – Você também veio ver o jogo? Fez muito bem. Eu não perderia por nada.


Fernando – Que bom que você veio. Encontre um bom lugar. Assim você pode ver melhor.


Maria - Sempre se espera tanto... Posso esperar aqui ao seu lado ? Gostei de você, sabe...desde o primeiro momento...


Edith - Não perdemos um jogo sabe, nós dois...


Fernando - Procure não perder nada... não, não é possível. Você pensa que está no melhor lugar. De repente algo chama sua atenção, você olha, e já não está mais ali.


Edith – O meu pai, onde está? O jogo já vai começar. Alguém viu o meu pai? Ele prometeu...


Maria – Ele não veio.(falando para a multidão) Agradeço a atenção, mas... ele não veio... Nem mesmo disse que viria, mas eu pensei que... Mina, ele não disse que vinha?


Edith - Ele disse que viria. Marcou comigo aqui.


Maria - Ele era lindo, sabem? Alto e magro, como sempre o imaginei. Quase não acreditei que

era para mim que olhava, mas sim, o seu olhar insistia e me falava. Falava comigo,

sem dizer uma palavra, mas dizendo tudo. Vocês me entendem, não?


Edith – Que história é esta que você está contando? Pensa que alguém pode acreditar nisso?


Maria - Aquele olhar, assim, em cinemascope, algo que não se pode mais esquecer. A partir dali cercou-me de todas as formas. Enviava-me flores, bilhetes, perfumes e poemas.


Edith e Fernando a aplaudem ironicamente.


Maria – (dirige-se a um espelho e repete o que dizia) Ele era lindo sabem, alto e magro, como sempre o imaginei. Quase não acreditei que era para mim que olhava, mas sim, o seu olhar insistia e me falava. Falava comigo, sem dizer uma palavra, mas dizendo tudo. Vocês me entendem, não? ...


Fernando – (dirige-se a um espelho) Não é monstruoso que esse ator, em uma ficção, em um sonho de paixão, possa forçar sua alma a sofrer com o seu próprio pensamento a ponto de empalidecer-lhe a face; lágrimas em seus olhos, o aspecto conturbado, a voz entrecortada, e todo os seus gestos adaptando-se em formas à concepção de seu espírito? E tudo isso por nada! Por Hécuba? Quem é Hécuba para ele ou ele para Hécuba, Para que a chore?


Maria – Está vendo? (apontando o espelho) Eu já disse pra ela que não serve mais, eu estou gorda, eu não tenho mais 17. Não, gorda não, eu ganhei um pouco mais de corpo... Tirei da gaveta na semana passada e cada vez serve menos. E tem aquele cheiro de mofo, sabe? Eu já pedi pra ela parar de olhar assim, mas... (para alguém da platéia) olha como ela insiste... (para Fernando) Tira ela dali!


Fernando – Ela quem?


Maria – Ali (apontando o espelho)


Fernando – Não tem nada ali


Maria – Tira ela dali!


Fernando tira o espelho da parede


Fernando – Chega! Eu vou embora. Nessa cena eu tenho que dizer que eu vou embora. Venho até esta porta, paro, penso num motivo para voltar e volto. No fundo eu sei que esta porta está trancada. Se eu quisesse sair eu sairia por aquela porta que está aberta. Eu ensaio esta cena sempre e toda vez eu tenho que ir até esta porta, parar, e saber por que que eu volto. Por que que eu volto? [Pausa] “Espera!” Eu gostava do jeito que ela pedia para esperar. Ela costumava chegar assim, entrava por ali, sentava nessa cadeira, sem rodeios, e dizia: “Espera!”. Não... era... (num tom afetuoso) “Espera!” (mais brusco) ... (Silêncio) “Espera!” (olha pra Edith) Vem aqui! Diz assim: “Espera!”


Edith – Espera!


Fernando – Não, não era assim... diz “Espera”, de um jeito doce...


Edith – Espera!


Fernando – Não, assim não, de um jeito doce mesmo... calmo


Edith – Espera...


Fernando – Não... mais doce...


Edith – Espera


Fernando – Não... doce assim, como criança, com um pouco de medo


Edith – Para com isso


Fernando – Ainda não terminei, diz “Espera Fernando”... só que de um jeito suave, infantil sabe?

Faz de novo!


Edith – Tá... “Espera Fernando”


Fernando – Por aí... agora diz isso como se você me amasse...


Edith – Chega...


Edith levanta-se.


Fernando – Diz... você entra, senta na cadeira e diz “Calma Fernando. Espera! Vai dar certo sim”.


Ela refaz o percurso. Entra, senta, cruza as pernas.


Edith – Tem certeza?


Fernando – Tenho! Era assim que ela dizia...


Edith – Não disso. Tem certeza que...


Fernando - “Calma Fernando. Espera! Vai dar certo sim”. Vai lá... doce, infantil, só mais uma vez...


Edith – Tem certeza que...


Fernando – Sim. Vai lá... só mais uma vez!


Edith – Tem certeza que vai dar certo?


Fernando – Não sei... mas diz...